a qualidade e o gosto

Sabendo que qualidade e gosto pessoal nada têm a ver, porque o segundo é subjectivo, mas a primeira nada tem de subjectividade, aqui fica a história.
Durante anos achei The Gift uma banda menor... Não conhecia e recusava-me a conhecer! Aquelas teimosias embirrantes que, ainda que cresçamos, continuamos a ter... Tal como quando éramos crianças...
Depois fui, meio contra vontade (arrastado por alguém que conhece muito bem a banda e principalmente o Nuno Gonçalves), a um concerto da banda e a minha opinião mudou. MESMO!
Hoje considero a capacidade criativa deste rapaz, mentor da banda, qualquer coisa de muito especial. Não consegue deixar de lado os seus critérios de qualidade e aprimora-se em tudo o que faz... Se olharmos para os arranjos de um album de The Gift à escolha, percebemos isso mesmo.
Há um par de semanas, perguntei ao tal Sr-que-me-levou-ao-primeiro-concerto-da-banda que andavam eles a fazer, caladinhos durante tanto tempo. A resposta: o Nuno está a trabalhar num projecto, Amália Hoje, em que se pretende apresentar um olhar diferente sobre algumas músicas celebrizadas pela Amália...
Nunca achei a Amália extraordinária (limitação minha, talvez), principalmente porque achava que não se percebia nada do que a senhora cantava e para mim o fado perde muito quando não entramos na letra. Sempre achei que, por exemplo, a Mariza é melhor do que a Amália alguma vez foi, muito embora aqui se trate apenas de uma questão de gosto... Mas o que é certo é que esta "grande senhora do fado" (Amália) cantou poemas fantásticos e excelentemente musicados.
Agora eis que aparecem os primeiros vislumbres do resultado deste trabalho em que o Nuno Gonçalves revisita a Amália através de vozes como as da Sónia Tavares (The Gift) ou do meu ex-colega de curso Fernando Ribeiro (Moonspell)... A julgar pelo single de apresentação, vem aí qualquer coisa... Qualquer coisa BOA!

princípio de Peter

Algures em 1969 o sr Laurence Peter saiu-se com uma tese segundo a qual, «nas organizações burocráticas estruturadas hierarquicamente, há uma tendência para que os funcionários sejam promovidos até ao seu "nível de incompetência"».
Por outras palavras, os funcionários vão trabalhando numa empresa e, devido à sua competência nas diversas tarefas, vão sendo promovidos até que, inevitavelmente, após a sua ascensão na carreira, atingem um nível para o qual não são competentes, mas que conseguem manter porque a despromoção não é um mecanismo habitual (afinal, se promovemos uma pessoa por mérito não podemos depois voltar a despromovê-la).
A consequência: nos cargos mais elevados temos pessoas que não são suficientemente competentes para os ocupar, mas que ficam lá, em prejuizo da empresa...
Penso no Peter e olho para o Canal Parlamento... Volto a pensar no Peter... Volto a olhar para o Canal Parlamento... ... Desligo a TV!

compaixão

Seguia Buda, um dia, o seu caminho,
Sob os raios de sol que o penetravam,
Quando avistou, deitado, um cão velhinho,
Com chagas, onde os vermes pupulavam.

E, com amor e fraternal carinho,
Limpou-lhe as chagas podres, que cheiravam
Tão mal! – livrando assim o pobrezinho,
Mendigo cão das dores que o matavam.

Mas, preocupado, continuou andando…
E lembrou-se dos vermes, que, ficando
Sem nenhum alimento, iam morrer.

E voltou junto deles; e um pedaço
De carne, ali, cortara do seu braço
E, abençoando-os, deu-lhes de comer.
Teixeira de Pascoaes, As Sombras


Apesar de provir do imaginário de Pascoaes, é um excerto demonstrativo daquela compaixão budista em que o sacrifício pessoal é considerado inferior à mais infima forma de vida, que nós, os civilizados do mundo novo, tendemos a considerar insignificante.

Era porreiro que nos contagiasse um pouco, esta compaixão...